Adriana Ancelmo e a prisão feminina : a discussão que o Brasil quer evitar, por Hérika Vale

O sistema carcerário brasileiro está abarrotado de pessoas que estão esquecidas jogadas dentro de celas em centenas de pontos pelo país. Estão lá aproximadamente 34 mil mulheres em um número crescente que é desconhecido pela maioria da população brasileira. Os motivos de suas prisões são os mais diversos entre eles, de acordo com o INFOPEN Mulheres (2014) o tráfico de drogas lidera um número de motivos para as prisões.

Dia 17 de março, o desembargador Abel Gomes, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, revogou a prisão domiciliar da ex-primeira-dama do Rio de Janeiro Adriana Ancelmo, ela, esposa do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, está presa em Bangu onde aguarda julgamento por fazer parte de uma das maiores quadrilhas já descobertas no país, responsável por um rombo de R$ 220 milhões nos cofres públicos.

Claro que não se pode comparar o crime de lavagem de dinheiro praticado por Ancelmo a um assassinato, tráfico de drogas, outros crimes que mantém suas autoras nas penitenciárias femininas , mas existe aí um claro manuseio de influências que logo foi percebido e se continuasse, como justificar esse favorecimento à esta senhora se não podemos rever os milhares de casos de mulheres presas, que estão ainda sem julgamento esquecidos nas gavetas dos fóruns?

De acordo com o relatório MulhereSemPrisão, realizado pelo Instituto Terra Trabalho e Cidadania-ITTC , as questões de gênero são sistematicamente invisibilizadas nos processos criminais, desde a abordagem policial até o fim do processo. A pesquisa relata que nos boletins de ocorrência, por exemplo, existe omissão de informações importantes inclusive sobre a maternidade, o que dificulta o acesso a direitos, como a prisão domiciliar.

A ausência de dados sobre maternidade é regra nos casos de mulheres presas, e até mesmo no INFOPEN Mulheres – levantamento de informações sobre mulheres presas realizado pelo Ministério da Justiça em 2014 – é omisso nessa questão. As questões de gênero são claramente ignoradas.

Quando Adriana Ancelmo foi liberada para continuar presa em casa, o foi sob o argumento de que ela tem dois filhos de 11 e 14 anos para cuidar. O que dizer das milhares de mães que também precisam cuidar de seus filhos?

O sistema prisional brasileiro está falido, não é raro escutarmos os casos mais absurdos, desde assassinatos, chacinas a mulheres colocadas nas mesmas celas que homens.As estruturas físicas desse sistema são imorais onde seres humanos são tratados como tudo, menos humanos, provocando uma brutalidade que deforma a vida dessas pessoas para sempre.

A situação das mulheres presas é solenemente ignorada pelo mesmo poder público que ia cometer o abuso de não estender o privilégio de Ancelmo, a milhares de outras mulheres que também são mães, mas não foi por isso que voltaram atrás. Segundo o MPF a advogada poderia continuar manobrando a gangue mesmo estando em casa. Mas um questionamento não quer calar: sendo o sistema prisional como é, onde alguns presos tem acesso a todo tipo de regalias dentro das dependências, quem garante que esta senhora gangueira não o fará de dentro de sua cela com ar condicionado?Conte-me outra, porque essa discussão está longe de acabar.

Enquanto isso continuamos não vendo, ou pelo menos fingindo.

 

 

Hérika Vale

Jornalista, Graduada em Língua Portuguesa , apaixonada por educação,pela cultura do meu sertão e pela boa política. Feminista com "F" maiúsculo ,com causa e propriedade, e colunista do Segunda Opinião.

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Jornalista, Graduada em Língua Portuguesa , apaixonada por educação,pela cultura do meu sertão e pela boa política. Feminista com "F" maiúsculo ,com causa e propriedade, e colunista do Segunda Opinião.

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